segunda-feira, 10 de maio de 2010

China: Pequim

Os monumentos de Pequim resumem cerca de nove milênios de história chinesa. Todavia, a cidade expandiu-se e desenvolveu-se extraordinariamente na segunda metade do século XX. Essa união do milenar com o contemporâneo tornou-a um dos símbolos da República Popular da China.

Capital da China, Pequim (ou Beijing, na transliteração pinyin) situa-se no nordeste do país, no interior da província de Hebei, a cerca de 160km do golfo de Bo (Chihli). A área onde se ergue a cidade de Pequim foi habitada por alguns dos mais remotos antepassados da espécie humana, como o denominado "homem de Pequim" (Homo erectus pekinensis), cujos restos, encontrados na aldeia de Zhoukoudian (Chou-k'ou-tien), remontam a cerca de 500000 a.C. Na antiguidade, a região era atravessada por caravanas que transitavam entre o interior da China e a Manchúria, o que lhe conferiu grande importância estratégica e comercial.

Histórico. No século V a.C., o reino de Yan estabeleceu sua capital em Ji, próximo ao local da futura Pequim. Destruída por Shi Huangdi, fundador da dinastia Qin, e reconstruída sob o governo dos Han (206 a.C.-220 d.C.), Ji recebeu o nome de Yan. Desde então, sua história esteve ligada à da luta dos governantes chineses para deter os ataques dos povos do norte, principalmente dos mongóis, que no século XIII conseguiram invadir e conquistar a China. Com algumas interrupções, Pequim é capital da China desde 1272, quando Kublai Khan, fundador da dinastia Yuan, decidiu estabelecer a sede de seu governo em Pequim e deu-lhe o nome de Khanbaliq (cidade do Khan); mas o nome pelo qual ficou popularmente conhecida foi Dadu (a grande capital).

As revoltas camponesas do século XIV puseram fim à dinastia mongol e Khanbaliq deixou de ser a capital. Em 1403, o imperador Yongle, da dinastia Ming, fundou a nova cidade de Pequim, situada um pouco ao sul de Khanbaliq. Tornada oficialmente capital em 1421, Pequim conheceu então novo período de florescimento e encheu-se de edifícios suntuosos. A dinastia manchu dos Qing (Ching), que ascendeu em 1644, manteve-a como centro político do reino e fez erguer várias construções monumentais, entre elas o palácio de verão, do século XVII, saqueado e incendiado pelos europeus em 1860 e depois reconstruído.

A história de Pequim -- e da China -- teve seu rumo modificado pela guerra de 1856-1860 contra a França e o Reino Unido. No último ano da guerra, os países ocidentais receberam permissão para instalar suas embaixadas num bairro que foi sitiado pelos rebeldes boxers durante vários meses, em 1900. Após a queda da dinastia manchu, em 1911, Pequim permaneceu como capital da China nacionalista até 1928, quando foi rebatizada Peiping (a paz do norte) e a capital transferida para Nanquim (capital do sul). Ocupada pelos japoneses em 1937, no início da guerra sino-japonesa, a cidade foi retomada pelos nacionalistas chineses em 1945.

Em 1949, os comunistas a conquistaram e declararam-na capital da República Popular da China, com seu nome histórico de Pequim. Tornou-se então importante centro político e econômico e cenário de agitações políticas, tanto durante a revolução cultural chinesa, na década de 1960, quanto em 1989, quando estudantes ali se reuniram em protesto contra a corrupção e foram massacrados pelo Exército.

Descrição urbana. Pequim mostra uma organização tradicional. Em torno da parte antiga se concentram os palácios, templos e prédios históricos - vários deles convertidos em museus e centros culturais pela revolução comunista de 1949 - bem como algumas instituições governamentais e oficiais.

O núcleo histórico compõe-se basicamente de duas antigas cidades muradas, que se comunicam entre si: a cidade interior do norte, construída pelos tártaros e situada no local aproximado da antiga Khanbaliq mongol, e a cidade exterior do sul, chinesa, acrescentada à anterior em 1521-1567, durante a dinastia Ming. No interior da cidade do norte está a Cidade Imperial e, no interior desta, a Cidade Proibida, composta por um conjunto de palácios que serviam de residência aos imperadores chineses. Fora da Cidade Imperial, o antigo bairro dos diplomatas estrangeiros abriga hoje hotéis, lojas, cinemas e teatros. Ao sul, ao lado de parques tornados públicos pelo regime comunista, a antiga muralha é atravessada pela praça da Paz Celestial (Tiananmen).

Na área norte da cidade interna, estão alguns prédios de grande importância histórica, como o templo lamaísta e o templo de Confúcio. Na cidade exterior, estão o centro comercial e a principal das quatro estações ferroviárias. Após a implantação do regime comunista, Pequim modernizou-se e se expandiu para além das áreas muradas, ganhou subúrbios residenciais e incorporou cidades próximas e distritos industriais. Uma dezena de rodovias e várias rotas aéreas ligam Pequim ao resto do país e do mundo. O Grande Canal, construído há cerca de 2.400 anos, une Pequim a outras cidades chinesas, como Tianjin (Tientsin), Xangai e Hangzhou.

A inquieta Pequim

Antes de deixar Pequim, a primeira coisa que uma pessoa sensata deve fazer é jogar o mapa fora. Mesmo que se volte para lá no ano seguinte, bairros inteiramente novos terão brotado praticamente do nada, arranha-céus terão eliminado os hutongs, os labirínticos bairros tradicionais onde a vida corria havia séculos praticamente da mesma forma, imensos shopping centers aparecem no lugar de quadradas lojas de departamento soviéticas, muquifos dão lugar a hotéis butique, os patos pendurados em varais pela rua somem na proporção em que restaurantes finos aparecem.

Nada que não se esperasse dessa cidade de 15 milhões de habitantes, centro financeiro da economia que mais cresce no mundo.

Pequim, ou Beijing, como a cidade quer ser conhecida daqui para a frente, se preparou de uma forma obsessiva e sistemática para receber as Olimpíadas de 2008. Além das transformações físicas, o governo fez um trabalho enorme de conscientização para a população receber bem os turistas.

Quem foi para lá há apenas três anos percebe o quanto está mais fácil circular pela cidade -não só as pessoas começaram a falar muito mais inglês, como as placas, sinais e até menus de restaurantes estão muito mais amigáveis para o estrangeiro. Até mesmo hábitos tradicionais chineses mal vistos pelos ocidentais, como cuspir nas ruas, foi desestimulado pelo governo por meio de pesadas multas.

Mas nem por isso o turista encontra uma cidade fake, remodelada para o evento esportivo de 2008. Pequim é daqueles lugares onde os acontecimentos históricos se somam, o que faz com que um passeio seja quase uma viagem no tempo. A Cidade Proibida, do século 15, continua praticamente como era quando o último imperador a deixou em 1911 e a China passou de reinado a República Popular. Para sentir esta passagem histórica basta sair do complexo de palácios reais e cair na soviética arquitetura de Tiananmen Square, a Praça da Paz Celestial, palco do massacre dos estudantes em 1989 e onde descansa embalsamado o camarada Mao Tse-tung. Uma multidão de 8 milhões de visitantes faz este trajeto todo ano.

Principalmente no auge do verão (os meses de julho e agosto), quando o turismo interno (num país de 1,3 bilhão de habitantes isso é uma grande coisa) se aquece, estes lugares e também os trechos mais visitados da Muralha da China, como Badaling, ficam praticamente intransitáveis. As temperaturas médias nesta época do ano passam facilmente dos 30 graus, enquanto no inverno (entre novembro e fevereiro) podem despencar para 5ºC ou 10ºC negativos. Nesta época, os lagos do lindo parque Beihai ou do Palácio de Verão costumam congelar.

A cidade está acostumada com mudanças e nem sempre estas foram para melhor. Pequim já foi incendiada, destruída por guerras, chacoalhada por terremotos. Mais recentemente, os templos que resistiram às intempéries e trocas de dinastias ainda tiveram que sobreviver aos soldados da Revolução Cultural e à sua obsessão por decapitar Budas, queimar livros, mandalas e outras relíquias sacras. Até as muralhas da cidade, erguidas na Dinastia Ming, há 500 anos, deram lugar a um anel viário em 1950.

Na Pequim do século 21 bairros como Chaoyang, onde está o novo Parque Olímpico, crescem à velocidade que os hutongs desaparecem. Nos anos 80 havia 3.679 hutongs na cidade. Hoje, são 40% menos. Cerca de 600 destes bairros típicos vão abaixo a cada ano, mudando radicalmente o visual da cidade. Casas, lojas e restaurantes têm desaparecido, mais notavelmente na região ao sul da praça Tiananmen, nos arredores de Quianmen Dajie. Apesar de o governo ter declarado proteger alguns desses bairros, não dá para garantir que quem visitar a cidade hoje vá encontrá-los. O que dá, sim, para afirmar é que Pequim é uma cidade para voltar sempre.


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